Ok, já sei que grande contradição! Casamento e feminismo podiam perfeitamente ser palavras opostas. Esta vossa amiga e fotógrafa de casamentos feministas vai tentar mostrar-vos que não!
O casamento é uma instituição social e cultural, geralmente reconhecida legalmente, que formaliza uma união entre duas pessoas. Pode variar muito dependendo da cultura, religião e contexto histórico. Historicamente o casamento tinha uma conotação de aliança económica, política e muitas vezes envolvia o controle da mulher, o que é interessante quando comparado com o feminismo.
O feminismo é o movimento social e político que busca a igualdade de direitos entre homens e mulheres, lutando contra a opressão baseada no género. diferentes ondas do feminismo (primeira, segunda, terceira e até quarta onda) e como cada uma teve focos distintos — desde o direito ao voto, até questões de identidade de género e interseccionalidade. Acredito que o feminismo pode representar diferentes reivindicações e vozes, mas uma coisa é certa: O FEMINISMO NÃO É A OPOSIÇÃO DO MACHISMO E DO SEXISMO! Como feminista, acredito na procura da igualdade para as pessoas, tanto mulheres, como homens, trans e não binários! Nós, feministas, defendemos a igualdade!
O que é um casamento feminista?
É aquele que o casal faz o que lhe apetece, um casamento com igualdade e com respeito pela sua identidade e pelos seus valores. Na minha opinião um casamento deve ser sempre isso, é uma festa que espelha a identidade do casal, que conta a história deles.
Obviamente que no casamento há alguns momentos que também espelham esta sociedade machista. E provavelmente muitos deles acontecem sem nos darmos conta, porque é o mundo em que nascemos e são coisas que já estão tão enraizadas que por vezes é difícil vê-las.
Vamos repensar algumas coisas que acontecem durante o casamento?
O Lançamento do Bouquet
Origem: Esta tradição tem uma origem que remonta a uma visão de competição entre mulheres para ver quem seria “a próxima a casar”. Historicamente, casar era visto como um objetivo importante para as mulheres, muitas vezes associado à sua segurança financeira e status social.
Por que é problemático?: Isso reforça a ideia de que o casamento é o “destino final” para uma mulher e pode criar uma pressão social desnecessária, especialmente em sociedades onde a mulher é valorizada pelo seu estado civil.
Como tornar mais feminista?: Porque serem todas as pessoas (que querem casar) apanhar o bouquet? Não impor este momento a ninguém. Ou até simplesmente podemos não ter este momento no casamento.
O Vestido Branco
Origem: O vestido branco se popularizou com o casamento da Rainha Vitória no século XIX, mas também carrega simbolismos anteriores de pureza e castidade, sugerindo que a noiva “deveria” ser virgem até o casamento.
Por que é problemático?: Esse simbolismo reforça a ideia de que o valor de uma mulher está ligado à sua pureza sexual, algo que o feminismo critica amplamente.
Como tornar mais feminista?: As noivas podem optar por qualquer cor que as represente, refletindo sua personalidade ou significados importantes para elas, ao invés de se sentirem obrigadas a seguir um padrão tradicional.
O Sobrenome do Marido
Origem: A prática de a esposa adotar o sobrenome do marido surgiu de uma tradição patriarcal em que a mulher passava a pertencer à família do marido, abandonando a própria identidade familiar.
Por que é problemático?: Isso pode ser visto como uma forma de apagar a identidade da mulher e reforçar a ideia de que ela “pertence” ao homem.
Como tornar mais feminista?: Algumas opções feministas incluem ambos os cônjuges manterem seus sobrenomes, criarem um sobrenome novo em conjunto ou até mesmo o homem adotar o sobrenome da mulher.
O Papel da Mulher na Organização do Casamento
Origem: Existe uma expectativa social de que as mulheres são as principais responsáveis por planejar o casamento, desde os detalhes até a cerimónia em si. Isso reflete a visão de que a mulher deve cuidar das atividades “domésticas” e relacionadas à família.
Por que é problemático?: Isso reforça estereótipos de género sobre o que é “trabalho feminino” e pode sobrecarregar as mulheres, enquanto os homens ficam com menos responsabilidade.
Como tornar mais feminista?: Um casamento mais igualitário implica que tanto o noivo quanto a noiva compartilhem as responsabilidades de planejamento, tomando decisões em conjunto.
O Véu
Origem: O véu no casamento tem raízes em várias culturas e simboliza a pureza e o fato de que a noiva estava “protegida” até o casamento. Em algumas culturas, também era usado para “esconder” a noiva até o último momento, como parte de um acordo de casamento arranjado.
Por que é problemático?: Em muitos contextos, reforça a ideia de que a noiva precisa ser protegida ou controlada até que seja “entregue” ao marido.
Como tornar mais feminista?: As noivas podem escolher não usar o véu, não colocar o véu na cara ou reinterpretá-lo de uma maneira que faça sentido para elas, talvez como um símbolo de escolha pessoal e autonomia.
A Entrega da Noiva pelo Pai
Origem: Essa tradição remonta à época em que as mulheres eram vistas como “propriedade” de seus pais, sendo literalmente entregues ao marido. Era uma transação entre dois homens — o pai e o noivo — com a mulher como objeto.
Por que é problemático?: Isso perpetua a ideia de que as mulheres precisam de permissão ou aprovação masculina para suas decisões de vida.
Como tornar mais feminista?: Uma alternativa pode ser a noiva caminhar sozinha até o altar ou o casal entrar junto ou ainda a noiva entrar com os dois pais ou com quem fizer sentido!
Padrinhos e Madrinhas e Despedidas de Solteiro e Solteira
Origem: Essa divisão reflete uma visão de género tradicional, onde os homens e as mulheres desempenham papéis separados e diferentes na cerimónia e na vida conjugal.
Por que é problemático?: Isso reforça estereótipos de género e excluir pessoas que não se identificam com esses papéis binários. E as mulheres não têm amigos homens? E vice-versa? E pessoas não binárias são madrinhas ou padrinhos?
Como tornar mais feminista?: O casal pode optar por uma despedida de solteiro/a/e misto (e o mesmo no casamento em vez de a noiva ter só madrinhas e o noivos só padrinhos), com pessoas de qualquer género assumindo papéis importantes, ou escolher amigos e familiares que mais os representam, independentemente do género.
Votos
Origem: Em muitas tradições de casamento, os votos incluem promessas de “honrar e obedecer”, especialmente da noiva ao noivo. Isso reflete a visão antiga de que a esposa deveria ser submissa ao marido.
Por que é problemático?: Essa linguagem sublinha uma dinâmica de poder desigual no casamento, contradizendo os princípios feministas de igualdade.
Como tornar mais feminista?: Os votos podem ser personalizados para refletir o respeito mútuo, igualdade e parceria. Expressões que simbolizam compromisso, respeito e amor sem conotação de obediência são alternativas poderosas.
O meu objectivo é abrir um pouco esta discussão e repensar um bocadinho em todas estas coisas “normais” num casamento que se calhar não tem o significado mais empoderador para a mulher, para o homem e para pessoas não binárias.
Feminismo é informação e escolha livre para o casal.
Já tinham pensado nestes momentos que acontecem durante o casamento? Acham possível fazer um casamento feminista? E faz sentido para vocês? Vamos conversar sobre isto!
Aproveito e deixo três sugestões de livros e duas obras de arte que adoro.
Tudo sobre o amor – bell hooks
A História da Arte sem homens – Katy Hessel
Mulheres Invisíveis – Caroline Criado Perez

Guerrilla Girls, 1989
Nan and Brian in Bed
Nan Goldin, 1983
Falei destes temas no podcast sobre casamentos da minha colega Rita Rocha. Podem ouvir este episódio (em português) aqui:
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